Ontem fui ver As Vespas. Entrei na sala do Paulo Quintela e aquele palco iluminado, a velha cortina de veludo azul, a ausência de conferencistas enfadonhos encheu-me de ânsia de ver a peça de Aristófanes. As luzes apontavam para Xântias, que relatava ao público, com uma voz-quase-segredo de escravo esfadengado, de cotovelo apoiado no joelho, cara encostada à mão, a história do velho Filócleon, que padecia de um terrível mal: o vício de julgar. Por isto Bdelícleon, filho do velho juiz, encarrega Xântias e o seu outro escravo, Sósias, de vigiarem o local onde tinha enjaulado o próprio pai, temendo que o velho fugisse durante a noite com outros juízes, seus amigos.
Eis quando, para espanto do público, durante uma encenada distracção dos dois escravos, um cortejo de velhos juízes, cobertos com os seus mantos e trazendo as suas lanternas, irrompe sala adentro chamando pelo seu velho amigo Filócleon. Empenhados em ajudá-lo a escapar, deixam cair os mantos e revelam os seus trajes negros, riscados de amarelo, cada um com o seu ferrão aguçado para espicaçar quem achassem que deveria ser julgado. Eram as vespas! E como se moviam sorrateiramente, empunhando o grande ferrão!
Apesar da sua ancestral e bem estudada estratégia, as vespas perderam a luta contra os escravos, curvadas já de velhice. Aceitando, sem outro remédio, a proposta de Bdelícleon, que havia conjecturado tudo para bem de seu pai, organizam-se para constituir o júri de um tribunal caseiro, ali mesmo no pátio, onde julgam o caso de um cão que era acusado por outro de ter roubado um queijo.
Mais tarde, numa discussão com o pai, Bdelícleon faz-lhe perceber os prazeres do homem boémio, contador de histórias, que se embriaga em faustosos banquetes, que aprecia a languidez do absurdo. E assim acabou a peça, em ambiente de festa, onde até o coro de vespas se juntou a uma dança contagiante.
O pano caiu. Os actores agradeceram e foram aplaudidos de pé. O público deixou a sala, já caída em silêncio. Saio calada e penso para dentro. Não seremos nós, convictos boémios, amantes do ócio dionisíaco, umas vespazinhas também? Não nos vestimos de negro riscado de amarelo, mas temos semelhantes ferrões, não na forma, mas na capacidade aguçada de ferrar. Padecemos do mesmo mal de Filócleon: uma terrível e incontrolável tendência para julgar.
Eis quando, para espanto do público, durante uma encenada distracção dos dois escravos, um cortejo de velhos juízes, cobertos com os seus mantos e trazendo as suas lanternas, irrompe sala adentro chamando pelo seu velho amigo Filócleon. Empenhados em ajudá-lo a escapar, deixam cair os mantos e revelam os seus trajes negros, riscados de amarelo, cada um com o seu ferrão aguçado para espicaçar quem achassem que deveria ser julgado. Eram as vespas! E como se moviam sorrateiramente, empunhando o grande ferrão!
Apesar da sua ancestral e bem estudada estratégia, as vespas perderam a luta contra os escravos, curvadas já de velhice. Aceitando, sem outro remédio, a proposta de Bdelícleon, que havia conjecturado tudo para bem de seu pai, organizam-se para constituir o júri de um tribunal caseiro, ali mesmo no pátio, onde julgam o caso de um cão que era acusado por outro de ter roubado um queijo.
Mais tarde, numa discussão com o pai, Bdelícleon faz-lhe perceber os prazeres do homem boémio, contador de histórias, que se embriaga em faustosos banquetes, que aprecia a languidez do absurdo. E assim acabou a peça, em ambiente de festa, onde até o coro de vespas se juntou a uma dança contagiante.
O pano caiu. Os actores agradeceram e foram aplaudidos de pé. O público deixou a sala, já caída em silêncio. Saio calada e penso para dentro. Não seremos nós, convictos boémios, amantes do ócio dionisíaco, umas vespazinhas também? Não nos vestimos de negro riscado de amarelo, mas temos semelhantes ferrões, não na forma, mas na capacidade aguçada de ferrar. Padecemos do mesmo mal de Filócleon: uma terrível e incontrolável tendência para julgar.
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