Caravaggio, 'Abraão e Isaac'
«A história dos homens é a história dos seus desentendimentos com deus,
nem ele nos entende a nós, nem nós o entendemos a ele.»
José Saramago,
Caim (2009, p. 91)
Desentendemo-nos com os deuses porque eles não nos compreendem nem fazem por nos compreender. Por eles somos marionetados e não nos é permitido questionar. E, contudo, não sabem, sequer, quem somos, Não querem saber do que trazemos por dentro. Dos nossos desejos mais íntimos - responsabilidade só nossa! - não querem ter ideia, porque completos são e nada lhes falta. Querem ver-nos cá em baixo, ovelhados, e passam os dias olhando apenas para cima, em querelas internas do próprio Olimpo, preocupações de panteão que nos não dizem respeito! Querem-nos sem ensejos e condenarão o primeiro que ousar pensar em olhar para o alto. Não nos é dado nem pensar nem saber o que se passa em cimeiros degraus. Que fitemos o chão com os nossos olhos, curvando a nuca; depois, as costas e, por fim, os joelhos, de cansaço.
Nosso olhar, como nosso pensar, não têm grilhões ainda e correm e revelam-se sem pudor, porque aqui não é o éden nem o sopé do sinai. Não estamos cegos; e como ainda não nos emudecesteis a todos, falaremos. Olharemos para onde quisermos: para os lados, onde a merda corre, e, depois, para cima, perguntando-vos porquê. Não gostam de ser interpelados! Não temamos! Afinal, quanto tempo nos foi concedido para cá estar e o que queremos realmente fazer dele? Não temos, de qualquer forma, escrita já a sentença? Alerta, sempre alerta. Questionando, nunca deixando de questionar.
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