domingo, 23 de março de 2014

De um quase-pesadelo

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Fugíamos, os três - éramos,pelo menos, três - por entre os escombros de casas, de escolas, de supermercados. Tudo estava vazio, pilhado, destruído ao nível de um cenário bélico. De que fugíamos nós, não sei bem: julgo que se tratava de um mal imenso que teria vindo ao Mundo para arrasar com a existência humana. Ou, pelo menos, a nossa realidade, o grande Mal tinha vindo para arrasar apenas a nossa pequena realidade, agora caótica.

Num momento seguinte, a porta de casa. E a casa intacta. Na esperança do abrigo, um outro perigo, ou um diferente cambiante do grande Mal, se punha perante nós, já exaustos. Eis que, de repente, sem saber de onde nem como, surgem três, sete, doze animais medonhos. Poderia descrevê-los como javalis alados, ou como cães raivosos com asas de morcego, mas não eram nada disso, ou antes, eram tudo isso numa morfologia exótica e de assustadoras proporções. Tentávamos desesperadamente entrar em casa enquanto enxotávamos aquelas grande gárgulas que, ou se mostravam interessadas em tragar os felinos da casa, com uma atitude horrendamente voraz, ora se penduravam no tecto, quais morcegos, ficando de focinho ao nível das nossas cabeças. E era com paus e traves que lhes batíamos e os enxotávamos, sem grande sucesso. Qual Hidra de inúmeras cabeças, apareciam as criaturas malignas com uma cadência directamente proporcional àquela com que eram eliminadas. E não paravam de chegar, e o desespero era grande, e a esperança já parca.
Após grande hiato, durante o qual poderá ter acontecido o inimaginável, eis que a nossa realidade pós-apocalíptica parecia livre de ameaças, ainda que tudo o que a vista alcançasse parecesse pouco mais do que ruína e miséria. Nisto, há uma velhota rechoncuda que, deitada em cima de uma velha bicicleta, exercita as pernas levantando dois leves pneus. «Vês?!», diz-me uma voz.


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