Já toda a gente adivinhava que este ia ser o primeiro casamento do grupo. Era certo e há muito esperado. Mesmo assim não deixei de me comover no dia em que recebi o convite, no momento em que desenlacei a fita de cetim cor-de-rosa, senti o veludo branco na ponta dos dedos, e ao ler as letrinhas redondas apercebi-me de que o momento estava, finalmente, para chegar.
Depois da felicidade inicial, seguiu-se a azáfama há muito avisada: ver a lista de casamento, comprar um vestido, uns sapatos, uma malinha de cerimónia, ir escolher um fato com o namorado, decidir boleias e horários. Se tudo isto, de início, me pareceu complicado, quando pus o meu plano de caça à roupa pareceu ainda mais difícil: ter de encontrar um vestido apropriado e discreto, elegante mas descontraído, se é preto há que contrastar com outras cores, se encontro um casaco bonito os sapatos são imediatamente riscados da lista porque, conforme a lei de Murphy, não combinam. Também convém que a maquilhagem esteja perfeita: nem muito exagerada nem simples demais, adequada a uma cerimónia sem que descaracterize o meu estilo, não podem nascer borbulhas, nem herpes, nem arranhões. Passada, sem saber bem como, esta lufa-lufa, há que avisar o namorado acerca dos tons que vamos usar, precisamente para que o seu fato não destoe por completo, porque é o que diz o “grande livro das regras dos casamentos”. De tudo isto, a lista de casamento até parece a parte mais fácil e divertida de todo este processo: é só ir à loja, ver as várias hipóteses, ponderar e tomar a decisão final. Ufa!
À hora marcada, naquele domingo, vieram buscar-nos os amigos de sempre, todos janotas, cada um com o seu fato elegante, a gravata cuidadosamente escolhida. Olhei para nós. Tão bem postos. Que idade teríamos naquele momento? “Estamos crescidos, meus velhos”. Contudo, já no carro, a caminho da recepção em casa da noiva, a música alta, os risos e as confissões de sempre fizeram-me perceber que há coisas que nunca vão mudar em nós. O mesmo na recepção: sem jeito, os janotas não sabiam bem como agir nem o que dizer, ainda assim, entrámos em grande estilo, todos chiques, carregando a geleira da despedida de solteiro, que ficou (mal) escondida a um canto do jardim. O noivo veio receber-nos. Radiante, sem mostrar uma ponta de nervosismo, bem disposto como sempre e elegantemente vestido. Nunca o tinha visto elegantemente vestido. Pensei onde estariam as velhas calças de basquet, as sapatilhas e a t-shirt despreocupada. Depois de petiscarmos qualquer coisa desafiaram-me para ir ver a noiva. Subimos as escadas do jardim e chegámos no momento em que a avó da noiva lhe estava a pôr o véu. Foi de cair o queixo.
Seguimos para a cerimónia, na capela da Universidade. Nunca tinha estado tão bem vestida em frente à faculdade, pensei. À porta as piadas nervosas e o último cigarro de solteiro. Tentámos entrar de modo discreto e escolhemos um banquinho onde coubéssemos todos, mais para trás caso algo corresse mal. Claro que, ao fim de vinte minutos de missa e coro, tornou-se hilariante reparar no que cada um fazia para tentar espantar o tédio. Finalmente saímos e deram-me para a mão um saquinho com pétalas de rosa e arroz. Foi, para mim, mais do que solene vê-los sair de braço dado, sorridentes mais do que sempre, abraçá-los, desejar-lhes o melhor e não ter palavras para dizer quanto.
A caminho do copo d’água fizemos um desvio para repor os níveis de cafeína e, ao chegar à quinta, não foi agradável percebermos que tínhamos chegado antes do cortejo matrimonial. Gaffe! Uma vez sozinhos, espreitámos as instalações, conhecemos os empregados e descobrimos que estávamos na mesa “Dama e Vagabundo”, que acabou por se revelar a mais divertida da festa. Depois das fotografias e dos copos de champanhe e martini, entrámos no salão e fiquei boquiaberta com tudo, desde a estrutura da sala até aos guardanapos da mesa. Fico sempre atrapalhada numa mesa cheia de copos altos, mas não fui eu a responsável pelo derrame de uns quantos. Depois de um banquete à antiga, os noivos abriram o baile e o karaoke. Fartámo-nos de dançar e cantar, como nunca nos tinha imaginado. Pouco depois descobrimos o bar e umas mesinhas ao ar livre e tenho ideia de termos ficado por ali umas valentes horas a conversar. De vez em quando o noivo vinha sentar-se connosco e então era só recordar e rir a bandeiras despregadas.
Como bons convivas, e como tínhamos sido os primeiros a chegar, também foi de “bom tom” sermos os últimos a sair. Cansados e felizes despedimo-nos dos amigos recém-casados e rumámos cuidadosamente de volta, entre cantorias e gargalhadas. Afinal, havemos sempre de ser (mais ou menos) os mesmos.